Ditador egípcio diz que quer deixar poder, mas teme gerar caos

O ditador egípcio, Hosni Mubarak, disse nesta quinta-feira em entrevista à rede ABC que quer deixar o poder, mas que teme o "caos" que pode ocorrer caso ele saia imediatamente. Em entrevista de cerca de 20 minutos à repórter da ABC Christiane Amanpour, ele afirmou que "está cansado de ser dirigente" e gostaria de deixar o poder mas não pode, "por temer que o país afunde no caos".
"Não me importo com o que as pessoas dizem de mim. Agora eu estou preocupado com o meu país, me importo com o Egito", disse Mubarak, enquanto violentos protestos contra ele chegam ao décimo dia seguido.
"Estou muito triste com (o que aconteceu) ontem. Não quero ver os egípcios lutando entre si", afirmou ele.

Khalil Hamra/AP
Manifestantes antigoverno atiram pedras durante confrontos no Cairo; mortos sobem para 13
Manifestantes antigoverno atiram pedras durante confrontos no Cairo; mortos sobem para 13 em dois dias
Os confrontos entre opositores e simpatizantes de Mubarak deixaram ao menos oito mortos nesta quinta-feira na praça Tahrir, palco principal dos distúrbios no Cairo, informaram fontes dos serviços de segurança. Com isso, o número de mortes nos confrontos sobe para 13 em apenas dois dias, além de mais de 1.500 feridos. Desde o início da onda de violência no país, há dez dias, estima-se que mais de cem pessoas tenham morrido, mas não há uma cifra oficial das vítimas.
As fontes não forneceram detalhes sobre o tipo de ferimentos as vítimas sofreram. A informação foi divulgada pouco depois do início do toque de recolher, às 17h do horário local (13h de Brasília), em meio a uma grande tensão nas ruas do Cairo.
O vice-presidente egípcio, Omar Suleiman, disse nesta quinta-feira que nem o ditador Hosni Mubarak nem seu filho, Gamal -- que era visto como possível sucessor do pai-- se candidatarão nas eleições presidenciais marcadas para setembro, informou a TV estatal.
No pronunciamento, ele também prometeu punir todos os responsáveis pelos episódios de violência que assolam o país, e pediu a soltura dos jovens detidos nos protestos antigoverno que não estejam envolvidos nos incidentes violentos.

Dylan Martinez/Reuters
Mulheres gritam slogans antigoverno durante protesto contra ditador Hosni Mubarak
Mulheres gritam slogans antigoverno durante protesto contra ditador Hosni Mubarak
Suleiman também afirmou que o diálogo político sobre a implementação das reformas prometidas por Mubarak "levará algum tempo" e envolverá todos os partidos políticos egípcios.
Entre os convidados está a Irmandade Muçulmana, principal força da oposição egípcia. Suleiman confirmou que o grupo foi "contatado e convidado ao diálogo. Mas eles estão hesitantes", disse à emissora estatal.
Apesar de ser o maior e mais organizado grupo no Egito, a Irmandade Muçulmana foi banida como partido político. Por isso, seus partidários concorrem nas eleições como independentes.
Suleiman afirmou ainda que eleições presidenciais, marcadas para setembro, não serão atrasadas --e podem até ser antecipadas para agosto-- e que, nesse período, acontecerão reformas legislativas e constitucionais. Especificamente, ele citou às restrições existentes para a nomeação de um presidente, e disse que elas serão amenizadas.
Ele ainda culpou estrangeiros, a oposição e empresários de inflamarem os protestos, e descreveu o papel dos militares no caos pela primeira vez. Ele disse que eles estão nas ruas para garantir o cumprimento do toque de recolher, proteger a população de criminosos e para encobrir a falta de capacidade da polícia para lidar com os protestos
PREMIÊ 
Mais cedo, o premiê do Egito, Ahmed Shafiq, reiterou seu pedido de desculpas pelos confrontos dos últimos dois dias na praça Tahrir, no centro do Cairo, entre manifestantes pró e antigoverno e disse não saber quem está por trás da violência. Em entrevista coletiva a jornalistas, Shafiq afirmou ainda que está disposto a negociar com quer for para encerrar a crise.
A entrevista ocorre horas depois de manifestantes pró e antigoverno voltarem a se enfrentar na manhã desta quinta-feira, em uma rua próxima à praça Tahrir, no Centro do Cairo, onde horas antes os governistas abriram fogo contra opositores do regime de Hosni Mubarak, no poder há 30 anos.

Dylan Martinez/Reuters
Manifestantes antigoverno gritam slogans durante protestos em massa; violência mata 13
Manifestantes antigoverno gritam slogans durante protestos em massa; violência mata 13 em dois dias
O Exército interveio para conter os manifestantes pró-governo e a agência de notícias Efe afirma que os militares chegaram a disparar para o alto para dispersar manifestantes.
"A prioridade é descobrir o que aconteceu ontem [nesta quarta-feira]", disse Shafiq, que prometeu uma investigação "completa e profunda" sobre os confrontos. "Para saber se foi planejado, acidental, liderado por uma pessoa, um grupo... Lidaremos de acordo com a lei e logo com quem for responsável pelo que aconteceu ontem e que causou este caos".
JORNALISTAS
Enviados para o Egito para a cobertura da crise no país, o jornalista Corban Costa, da Rádio Nacional, e o repórter cinematográfico Gilvan Rocha, da TV Brasil, foram detidos, vendados e tiveram passaportes e equipamentos apreendidos.
Desde a noite de ontem até a manhã desta quinta-feira, Corban e Gilvan ficaram sem água, presos em uma sala sem janelas e com apenas duas cadeiras e uma mesa, em uma delegacia do Cairo.
Segundo o enviado especial da Folha ao Cairo, Samy Adghirni, os conflitos entre manifestantes pró e contra o ditador Hosni Mubarak chegaram à porta do hotel Hilton, onde havia jornalistas estrangeiros hospedados. Ouça o relato:
"É uma sensação horrível. Não se sabe o que vai acontecer. Em um primeiro momento, achei que seríamos fuzilados porque nos colocaram de frente para um paredão, mas, graças a Deus, isso não aconteceu", afirmou Corban, que volta amanhã com Gilvan para o Brasil.
Para serem liberados, os repórteres foram obrigados a assinar um depoimento em árabe, no qual, segundo a tradução do policial, ambos confirmavam a disposição de deixar imediatamente o Egito rumo ao Brasil. "Tivemos que confiar no que ele [o policial] dizia e assinar o documento", contou Corban.
No caminho da delegacia para o aeroporto do Cairo, Corban disse ter observado a tensão nas ruas e a movimentação intensa de manifestantes e veículos militares nos principais locais da cidade. Segundo ele, todos os automóveis são parados em fiscalizações policiais e os documentos dos passageiros, revistados. Os estrangeiros são obrigados a prestar esclarecimentos. De acordo com o repórter, o taxista sugeriu que ele omitisse a informação de que era jornalista. Fonte: Folha de São Paulo
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